quarta-feira, 17 de abril de 2024

inferno surrealista

prédios e suas varandas vazias

envidraçadas

lá de cima é possível ver

de um lado o brooklin

do outro, o campo belo

logo abaixo,

carros atravessam

o mar de asfalto congestionado

e de uma avenida, surgem outras avenidas e mais outras,

nasce uma rodovia, uma ponte

uma obra megalomaníaca de um monotrilho

E no meio dessa construção

vivem quatro famílias


cobertor pendurado na grade, 

papelão, saco plástico

sofá rasgado, cachorro

colchão, fogueira, panelas

e no meio dessa tragédia social

um bebê sem camisa

enfia um biscoito recheado inteiro

na boca


seis  horas em ponto

o trânsito pontualmente paralisa

de patinete elétrico, óculos escuros e sapatenis

um faria limer atravessa o congestionamento

e de repente, as janelas se acendem

piscam

ficam coloridas

decoração de natal

na avenida roberto marinho

o bebê surpreso 

numa explosão de alegria

solta uma gargalhada

e deixa o biscoito cair




terça-feira, 26 de março de 2024

uma gota carrega tanta coisa

lágrima é a materialização física do abstrato

extrato concentrado de tristeza saturada

escorre pelos olhos feito tobogã

desliza pelo rosto e despenca

carregando consigo parte dessa saudade









sábado, 10 de fevereiro de 2024

bom dia!

enquanto o mar 

se alonga nas areias

os prédios de santos

reclamam em silêncio 

de dor no ciático


o mar trouxe de presente

uma concha

mas os prédios

só queriam

um tandrilax


acampado no jardim

o mendigo dorme

passarinhos, borboletas

a manhã parece tranquila

até chegar o calor

sol grita no céu

surgem pessoas

carros

cachorros

crianças

bicicletas


vendedores ambulantes gritam:

"olha o queijo coalho!"

" a sogra morreu ajuda eu!"

disse o vendedor de empadas


sirene, carro de polícia

carrinho de bebê, mosquitos

pombas, frescobol

o calor se intensifica

e o mendigo dorme






segunda-feira, 25 de dezembro de 2023

Mus(eu)

imagine um louvre inteiro

só sobre você

com exposições permanentes

e outras itinerantes


no fundo

somos um museu desorganizado

de nós mesmos


no meu caso um acervo 

de 41 anos sem curadoria

um labirinto de memórias bagunçadas

de um museu abandonado sem querer


ramificações me conduzem 

por galerias de momentos 

o tempo se mistura

anos 80, 90, ontem

onde minha cabeça estava?

fragmentos interrompidos

esculturas inacabadas

salas e mais salas 

quadros na parede

fotografias, murais, desenhos

cheiros, músicas

pânico!

olho para os lados

em busca de


SAÍDA DE EMERGÊNCIA

todo museu que se preze

tem que ter um fuga

a porta se abre

e um divã

vivi? 

minha psicanalista

a minha espera

cinquenta minutos depois

e mais questões surgem

ela encerra com um clichê

"nos vemos na próxima quinta?"


mais calmo ou não

volto para o museu

retorno ao mergulho para dentro de mim


Escadas rolantes no museu?

saí do louvre e entrei no pompidou

Minha vida ficou contemporãnea

Retratada nos salões interativos

google fotos na parede

revelam vídeos, stories, 

bumerangues

Instalações interativas

lembranças em realidade aumentada 

diminuída, realidade não mais real

realidade sentida

basta o acaso de uma música

para acordar uma memória

converso com o spotify e o questiono

" por que você escolheu essa?"


caleidoscópio

versões simultâneas, múltiplas, invertidas

perspectivas por todo lado

tropeço em lembranças


museu de uma vida inteira

museu de uma vida só

frequentado por um único visitante

um observador de si mesmo

reflete sobre o quão louco

e absurdo é estar aqui.


com essa reflexão vou parar numa lojinha?

tudo é sobre mim?

esses museus sempre acabam em lojas

são souvenirs da minha vida

minha fita k7 preferida, uma réplica do meu walkman

uma miniatura da beliche vermelha que eu eu maria dormimos

meus livros de poemas

chaveirinhos, fotos e vídeos dos personagens da minha vida 

lápis com frases, apelidos que só fazem sentido para mim

desenhos? quem vai querer comprar esses desenhos?

quem vai querer comprar esses coisas?

Eu, talvez!









sexta-feira, 24 de novembro de 2023

blackfriday!

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domingo, 12 de novembro de 2023

Porre de mim mesmo

completamente bêbado

nessa minha realidade sóbria

tão sóbria que é um porre


porre de alegria

de vinho, cachaça, cerveja,

celular, camisinha, porre de transa 


embriagado nessa conversa

embarco no delírio coletivo existencial

onde queimo neurônios, bagulhos, empadões, tabacos,

queimo o filme


mergulho numa deliciosa larica

e de repente

me vejo passando brigadeiro

numa torrada bauducco 


adormecer é uma onda

que me leva para longe

um infinito de possibilidades

de cores, sons e cheiros


já o despertar

é entender

que a realidade

é uma viagem

louca, múltipla

e simultânea.

uma realidade de horários

onde o tempo passa

e eu cambaleando

tento acompanhar

as urgências


olhando para o céu escuro

uma tontura súbita me invade

o dia passou. não percebi

estou completamente embriagado nas responsabilidades


embriagado no amor 

na saudade, na dor

na presença do passado

e na projeção do futuro

o presente balança, tropeça

se desequilibra

mas não cai



abro um vinho

coloco uma música

e a viagem prossegue aqui

 numa onda sonora

que acessa sentimentos

trancados numa gaveta.


o bêbado dentro de mim 

vira desenho animado

dança,

fala alto, abraça.

é inconveniente

não quer ir embora

de mim mesmo.


os olhos se abrem

tudo gira

cabeça grita

ressaca real

aspirina

água

porre de dipirona


porre de cafeína, porre de açúcar

as dosagens se misturam

num grande coquetel

o desconforto passa

e uma onda enorme

me pega desprevenido

caixote!

levanto

todo sujo

água, sal, sol, areia

Completamente chapado de maresia.


é tanto trocadilho

que me vem um enjoo

não poderia ser diferente

encerro esse poema

vomitando palavras ambíguas


Saideira! Saideira!

Garçon! Mais um chopp!

Esse poema é como um bêbado

Inimigo do fim, não quer ir embora


Bota um choro nesse copo!

Vamos brindar pela décima vez

Um brinde a loucura do normal!


















terça-feira, 15 de agosto de 2023

inverno aquece a minha solidão